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Como o monge mais famoso da Europa pode nos ajudar a redescobrir o poder do silêncio

21 de março, é comemorado o aniversário celestial de São Bento de Nursia, o grande pai do monasticismo ocidental e co-patrono da Europa. Pode um monge que viveu a 1.500 anos atrás nos ensinar alguma coisa para os dias atuais?

Não só tem muito a nos ensinar, como também o fato de que viveu a muito tempo atrás lhe dá certa vantagem.  Segundo, C.S Lewis diz no seu prefácio de On the Incarnation de Santo Atanásio de Alexandria, os modernos, isto é, pessoas que estão vivendo no mesmo tempo, tendem a ficarem presas a suposições de como as coisas são, devem ser ou poderiam ser, admitindo-as como verdades e não aceitando alternativas; Enquanto que, os anciões, levados por suposições completamente diferentes das nossas, estão em posição de confrontar, questionar, debater e até mesmo derrubar as nossas suposições. Ele conclui que quanto mais antigos são os livros que lemos, mais conhecimento próprio, autocrítica e auto aperfeiçoamento poderemos adquirir. A ironia é que apenas coisas antigas podem nos fazer novos, e coisas exclusivamente novas podem nos fazer envelhecer de maneira tola.

Um maravilhoso exemplo desse fenômeno pode ser a moderna campanha contra o silêncio – sim, vamos chamar de campanha, pois é conduzida como uma guerra que não tem prisioneiros. Cardeal Sarah, como sabemos, tem falado eloquentemente – e, o que é mais difícil, de uma profunda fé e espírito de adoração, sobre a ditadura do barulho na vida secular e cada vez mais no domínio do sagrado. Está se tornando mais e mais difícil encontrar algum lugar silencioso no mundo: cafés e restaurantes tocam música tão alta que as pessoas mal conseguem falar umas com as outras; lojas, mercados, escritórios, todas as instalações parecem estar agindo sob um memorando cósmico para evitar o silêncio a todo custo; se o barulho do ambiente é inadequado, os fones de ouvido onipresentes garantirão um fluxo contínuo; mesmo parques ou áreas recreativas têm a sua paz tomada pelos ruídos dos carros e aviões cruzando o céu. Como se isso não fosse desafiador o suficiente para a saúde mental, raramente se encontra uma Igreja Católica ou liturgia que respeite a necessidade humana de uma lembrança silenciosa na presença de Deus vivo, que fala ternamente ao coração receptivo.

Um amigo e eu, estávamos, uma vez, conversando sobre: “O que é melhor na Missa, silêncio ou música?” Ele escreveu o seguinte:

“Silêncio se dá em diversas formas. Existe o silêncio de desespero; há o silêncio repentino em um pôr do sol bonito; há o silencio de temor; há o silêncio de confusão; há o silêncio de intimidade e proximidade.  De todos os formatos do silêncio, alguns são apropriados em um Santa Missa, outros não.

O que define silêncio, são os ruídos ao redor dele, como uma moldura define a porta. O silêncio que alguém ouve após uma batida ou antes de um grito é definido pela batida e pelo grito. O silêncio que vêm depois de um canto Gregoriano ou antes do anúncio sagrado do Padre é definido pela música antes ou as palavras na sequencia. Então, no final, não pode-se escolher entre a música ou o silêncio, porque é a música que define o silêncio, e o define como – esse – tipo de silêncio. Ainda sim alguém pode perguntar, se devemos preferir a silhueta ou o papel branco ao seu redor.

Quando estou em uma Missa com cantos e guitarras, o silencio entre as músicas tem uma característica definida e denominada: tempo morto.  É o silencio que ouvimos entre os atos.  A música Sacra na Missa – canto gregoriano, polifonia, hino clássico, instrumentos de órgão – agem como uma moldura em torno do silêncio e assim o define como um silêncio sacro, densamente significativo, pronto para ser preenchido com oração. Por outro lado, o silêncio na missa atua como uma direção ou peso interno para a música, mantendo-a ancorada na eterna quietude, a “Palavra sem palavra …”

São Bento entendia muito sobre esses assuntos, como podemos ver em sua Regra Sagrada, onde ele cita varias vezes sobre a necessidade e a importância do silencio. O mais característico são suas palavras sobre o oratório ou capela: “Assim que a Obra de Deus [a liturgia] terminar, todos reverentemente saiam do oratório, em completo silêncio, para que qualquer irmão que por acaso deseje orar individualmente não prejudicada pela má conduta alheia” (Regra, 52). São Bento entendia que a liturgia pretende abrir dentro de nós um espaço para Deus e um espaço para o silêncio, para que nossa oração, a conversa de amigos amorosos, possa florescer.

São Bento insiste mesmo assim no silencio literal durante a noite e, sempre que possível, durante o dia. E no rico capítulo 4 da Regra Sacrada, em relação aos “instrumentos de boas obras” (que podem servir de base para um excelente exame de consciência), ele nos fornece uma razão negativa baseada na natureza humana decaída e uma razão positiva baseada no objetivo elevado da vida cristã.

São Bento reconhece que, como pecadores, somos, com demasiada frequência, humilhados, depreciados, maus e com conversas depravadas e excessivas – e que essas coisas nos dificultam “ouvir com boa vontade uma Santa leitura e estar frequentemente ocupado em oração”. Embora ele não mencione isso, a mesma dificuldade surge de qualquer ruído inútil, frívolo ou perturbador em nosso ambiente.

Mas porque iriamos querer “ler uma Santa leitura” ou “estar ocupado em oração”? O mesmo capítulo estabelece a meta: para que nos tornemos estranhos aos feitos do mundo, coloquemos a nossa esperança em Deus, e preferir nada que não seja o amor de Cristo.

Para muitos de nós que vivemos no mundo, essas frases estabelecem um ideal brilhante, sempre realizado de maneira imperfeita. Ainda assim, não se pode alcançar um destino distante sem dar passos, pequenos ou grandes, para alcançá-lo. Um coração pacífico e cheio de amor silencioso, bebendo o cálice do Senhor e provando a doçura de Sua vitória na amargura do sofrimento – é aqui que queremos terminar. Se vamos chegar lá, precisamos começar aqui, agora, hoje, com mais tempo, mais espaço, para o silêncio em nossas vidas.

 

Tradutora: Julia Palaoro

Fonte: Life Site News

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